30 de novembro de 2007


Olhar de Inverno


Tudo transparece o Inverno

O fogo acorrentado da lareira

Que me sufoca o olhar


As árvores curvadas

Em vénias de sobrevivência

As folhas acumuladas à beira da estrada

Amarelas de enfermas


As pessoas que passam

Vejo-as suspensas por fios

Marionetas sem cor


Passei por tudo isto

E não vi nada

O meu olhar estava turvado das chuvas

De Inverno


Tentei fixar as montras

Enquanto passava

Mas olhava-as distorcidas

Vazias

Da minha ausência profunda


Estava tão triste que não podia estar ali

Fechei os olhos

Só queria o preto da noite

Confundindo aqueles rostos

E a estrada me levasse de volta

Ao meu castelo interior

19 de novembro de 2007


Fidelidade


Um dia sonhei

Mas em traços de luz e de noite

Em sombras

Confundi o sonho com a realidade

Quem é a minha fidelidade?


Era eu talvez um guerrilheiro

Em lutas de sobrevivência

Olhando armas, em vez de barcos

Percorrendo pântanos, em vez de florestas

E em tudo ardia o desejo de matar

Para não morrer

Questionei se a defesa será fidelidade


Era eu talvez um vagabundo

Sem ter por quem olhar

Desfeito em ferro velho

Sem cor nem brilho

E a fidelidade terá cores?


Era eu talvez rei

As pessoas não podiam sonhar

Porque o sonho era ter tudo

E a fidelidade era só minha


Sonho a vida

Um dia guerrilheiro, outro vagabundo, em momentos rei

Sem ser nenhum

E um dia anseio ser fiel à vida

12 de novembro de 2007


Abandonado ao sonho


Não percebo como aconteceu

Mas um pedaço de mim deu lugar a esta dor

Talvez saudades


Já não sei estar onde estou

Não quero pertencer a quem pertenço

Tudo parece gasto

O sorriso, a noite e o vento

Já não têm cor

São feitos decor


É um rosto perdido entre tantos outros

Que parecem iguais ao chegar

São mãos que acenam por ninguém olhar por elas

São braços que se estendem em confidências

De um abandono

De uma mãe fingindo-se morta

Quem só aprendeu a resistir


O meu sonho não tem contornos

Tem histórias, paisagens e rostos

De cor escura

É um olhar de dentro para fora

Vive comigo o sonho

Mas não é meu


É cheio de simplicidade e beleza

E risco

Pela terra sem nome, virgem

Onde os pássaros não conheço

E a chuva é intensa

Onde as palavras são de agradecimento

Pelos momentos de esperança

4 de novembro de 2007


Tu existes


Inteligência em fragilidade

De querer o visível, o justificável

E não apreciar esta liberdade

De recriar em amor, de ser apenas fé

Sem palavras, sem corpo, sem tempo nem espaço


Apelidamo-nos de mentalmente sãos

Se pudermos seguir pelo visível,

Pelo que tem cheiro

Por formas e cores


Esquecemos o essencial

A mistura de todas as cores

Numa só, invisível

Inventada por quem a quiser ver


O essencial tem ausência de formas

De limites, da consciência de cada um

É ausência de mim

Porque um dia deixarei de ser eu

Para ser parte de um todo

Adimensional, sem gestos

Longe e perto de tudo

Grande e pequeno

O fim e o início


Porque Tu existes

E és a cor