20 de janeiro de 2011

O silêncio das palavras

Fechado no quarto
Vou batendo ao de leve com os dedos na estante dos livros
O silêncio é cru, prolonga-se para além do corpo
Não sinto senão o vazio
Que não é um sentimento, um estado de espírito
É a ausência feroz de sentidos
Um estado pálido de sensações que estagna o meu sangue

Se eu morrer, tu serás morte
Mas não há dor nisso
É como um balde de água que se despeja
Não te olho
(ver é sonhar)
Não te respiro
(respirar é correr o risco)
Sou inerte, sou a brisa do fim de tarde
Que passa sem se sentir

Gritas na minha direcção
Como quem apaga o quadro escrito
Sussurras baixinho
Como quem acaba de contar a história ao filho
Mas a névoa que tenho à volta da alma não esvanece
Talvez se liberte com a morte

Nada resta
Tenho vontade de adormecer no silêncio das palavras

9 de janeiro de 2011

A negação do sonho

Se pudesse escolher entre vidas
Escolheria não viver nenhuma delas
Pela ausência da inconsciência
Que este sentir do sonho – ainda que não o conheça – me dá

Vivo de sensações que o corpo esquece
E a memória transforma
Vivo de sonhos que o meu inconsciente inventa
E o corpo nega

Vivo no limite entre o ínfimo e o eterno
Porque não sou nenhum deles
Vivo entre estados de alma de um Deus
Que a razão não pode justificar

Por que sonho então?
Pela negação dos sentidos
Ou pela reinvenção do contraditório?